quarta-feira, 23 de setembro de 2009

SAC. (texto para teatro)

[Toma alguns comprimidos e um gole de um líquido âmbar. Espera.]
[Toma mais comprimidos e mais um gole. Espera]

Não está dando linha...

[Toma mais comprimidos. Pára. Toma mais ainda e um grande gole do líquido]

Está chamando! Alô? Alô, oi!
(...)
Pode sim. Eu adquiri um dos produtos de vocês, mas não estou satisfeito e gostaria de efetuar a devolução...
(...)
Não, não, ainda está na validade. O problema é com a qualidade da mercadoria realmente.
(...)
Olha... Qual seu nome mesmo? (...) Então... eu sei que vocês são o empreendimento mais antigo do mundo, conheço a fama de vocês. A questão é que, se vocês não fabricassem produtos defeituosos, não haveria um serviço de devolução, concorda?
(...)
O que? Olha aqui, mocinha, eu não danifiquei nada, não é de hoje que essa merda está quebrada, e se eu não havia ligado até agora é porque não queria pagar o preço da ligação!
(...)
Eu não estou nervoso, de forma alguma. Só acho um desrespeito com o consumidor dar garantia de felicidade sobre esse produtinho de quinta que vocês fazem tanta propaganda!
(...)
Ah! Quem você pensa que é, hein? ... Qual seu nome de novo? (...) Bom, coisinha, eu quero falar com o seu superior imediatamente!

...

Alô?! (...) Isso... O Senhor é o responsável pela matriz? (...) Bom.
(...)
Ajudar, você deveria ter ajudado há 20 anos atrás não me dando a porcaria de uma mercadoria defeituosa! Mas se o Senhor melhorar o atendimento dos seus funcionários, acho que já é um bom começo! Tudo o que eu quero mesmo é me livrar disso de uma vez e descansar...
(...)
Sim. Sei que a devolução é definitiva e que não há reembolso, estou ciente. (...) Uhum.
(...)
Estou muito mais do que insatisfeito, meu Senhor! (...) Li o manual, li todo sim.
(...)
Amei, demais até, mas não fui correspondido...
(...)
Sonhei também, mas eles foram sendo todos destruídos irreparavelmente. (...) Sim, tentei. (...) Uhum. Todos impossíveis.
(...)
É... isso eu não entendi muito bem. Li esse capítulo umas quatro vezes, mas não entendi... Se bem que uma vez perguntaram se eu estava fazendo academia e eu consegui gostar um pouquinho de mim por quase duas semanas.
(...)
Fiz amigos, sim, muitos, mas me sentia sempre sozinho.
(...)
O Senhor acha? Pode ser...
(...)
É, mas o maior problema mesmo era com o amanhã. Veio faltando... é. Sempre que me deitava para ir dormir, pensava no outro hoje que eu teria dali a algumas horas, aquela insistência naquele anoitecer intransponível, que impedia que qualquer um pudesse me enxergar de verdade, realmente, sinceramente, e que tampouco me deixava encontrar qualquer lugar onde me apoiar. Apenas desejei que todos os ponteiros de todos os relógios de todo o mundo tic-taqueassem o mais rápido possível para que a real noite pudesse chegar anestesiando minha mente e coração moribundos de exaustão, fechando meus olhos cansados de visualizar o passado na expectativa de cada novo passo à frente.
(...)
Uhum...
(...)
É...
(...)
É, o Senhor tem razão...
(...)
Uhum... é...
(...)
O Senhor faria isso por mim?
(...)
Sério? Quanta gentileza, eu nem acredito.
(...)
Então quer dizer que se eu fizer este depósito neste valor... eu posso fazer a devolução do produto? Que maravilha! Muito Obrigado, Senhor!
(...)
Adeus então. Adeus, Senhor.

...

Que homem bondoso, é um santo esse homem!

[Levanta satisfeito, cai abruptamente, morto.]

2 comentários:

  1. maravilha. bom tê-lo de volta!
    (amei ter recebido sua mensagem)

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  2. não sei se eu entendi direito mais depois eu digo o que eu entendi e vc me explica o que vc quis dizer..
    a parte da academia fiquei imaginando vc
    AHUHUHAUHAUHUHUH
    sério?parece?olha minhas costas?
    AHUHAUHAUHAUHUHA
    beijo,gato!

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