quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

Diário de Lisboa . Apenas o fim do mundo

Foi apenas um copo de cerveja, uma Super Bock de 400 ml por 3,80 euros.
Foi apenas a dançarina de Cabo Verde chamada Camila dançando e vendendo os cd's da banda por 10 euros.
Foi apenas a música em frente à estátua de Fernando Pessoa.
Foi apenas o anoitecer. Foi apenas um ponto muito turístico demais.
Foi apenas The XX tocando dentro de mim ao ritmo de "chega de saudade, a realidade é que sem el...".
Foi apenas um encantamento com a menininha de casaco vermelho dançando antes de saber andar, lá, entre as pessoas indo e vindo na calçada.
Foi apenas saber que via a Camila dançando em pontos diferentes da cidade desde minha chegada.
Foi apenas o céu do tamanho da vida do universo lá em cima, suspenso, como um grão invisível. As Três Marias acompanhando minha viagem quando o que eu achava é que só voltaria a vê-las em seis meses. Vim acompanhado de amigos afinal.
Foi apenas a brasileira de sobrenome "Alegria" sentada no desnível da calçada vendendo desenhos antes de ser brasileira.
Foi apenas um par de olhos azuis que prometem e escondem muito.
Foi apenas o calor que fez hoje...
Foi apenas as pessoas. As pessoas. As pessoas.
Foi apenas... e foi pouco mesmo. Foi tudo pequeno como aquela partícula de poeira que a gente surpreende na luz do sol, ou como aquele pontinho semi-transparente que foge da pupila quando a gente tenta olhar diretamente pra ele.
Foi pequeno como os dias que achei natimortos, como os amores dolorosos e os inesperados - que são os mesmos -, como os dias ensolarados em que chove, como duas pessoas que duram pra sempre numa noite, pequeno como o encontro e o reencontro, foi pequeno como a perda...
Foi apenas isso e pequeno como a minha simples vontade de falar que o vulcão está em erupção. Que está a explodir num espetáculo lindo e terrível, que está a queimar tudo aqui dentro, destruir todos os calendários internos... Aqui dentro eu já enfrento o fim do mundo, e que todos podem se acalmar porque os maias fizeram aquele calendário pensando somente em mim, eu sou 2012 aqui dentro.
E é apenas o fim do mundo.

Hoje, eu espero que todos que eu amo queimem, tenham uma auto-estrada de altíssima velocidade cá dentro, tenham os olhos ardendo da mistura do riso com a lágrima, que sejam donos do mundo e deuses de outros só seus, que tenham o futuro do tamanho de dois segundos a cada dois segundos, que tenham o grave de suas músicas vibrando o peito.
Hoje, eu só desejo que todos que amo sejam muito felizes.
Eu desejo tão pouco neste momento.
É tanto desejar que querer pouco assim seja sempre?

4 comentários:

  1. Esqueci de contar das escadas que davam pro Tejo, começavam na Praça do Comércio e desciam até não sei que profundeza do rio, abrindo-se para uma imensidão de rio que se faria mar. Das ondas cada vez mais mar que invadiam a escadaria degrau a degrau até nos surpreender com uma espuma tsunâmica que nos fez pular e correr para não nos molharmos. Mas talvez essa seja outra história... uma também sobre duas gaivotas a cumprirem a função de porteiras de Lisboa, pousadas sobre duas ilastras plantadas nas águas do Tejo...

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  2. um viva à felicidade.
    e uma vida para esta alma feliz.

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  3. "Que está a explodir num espetáculo lindo e terrível(...)" à la Von Trier...

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  4. chega de saudade
    e o desejo de muitos dias felizes.

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